Monday, May 21, 2007

uma fotografia rasgada… a minha infância!

Cresci, mas memorias continuam em mim. Lembranças da nossa cave direita, saudades das corridas pela rua, da apanhada, das escondidas, dos recados e do mercado. Tempo que o relógio tenta apagar aos poucos, sem êxito. Já olharam para traz desta maneira? Reviver a vida no pensamento? Tentem! Vão passar um bom bocado ao reviver os desenhos animados que incentivavam o acordar madrugador, as manhãs passadas a frente da televisão, as horas perdidas no sofá, as birras pelas bolachas no mercado, as compras quando enchíamos o carro com uma montanha de doces e rebuçados sob o olhar atento da avó que tudo comprava, as prendas inesperadas da madrinha ou do abraço no final do dia da mãe antes do dormir… Já sonharam com o que foram? Hum… Estou consciente que sim.
O meu primeiro dia de aulas. Que episodio para lembrar… Ainda se lembram? Aquela mochila colorida, azul forte, com um urso na frente… um urso, não, um panda em tons brancos e pretos. Achava a mochila enorme naquele dia, mal conseguia carregá-la nas minhas costas. A minha mãe pega-me na mão e subimos até a escola. Que emoção ao cruzar pela primeira vez aquela passadeira, antes de ficar perante o enorme portão colorido de lápis pintados com cores do arco-íris. Pensei “Lápis tão grandes? Quem é que pinta com eles?”. Vi abrir o portão e próximo dele a Dona Jacinta solicitava a entrada dos meninos que olhavam o portão tão fascinados como eu. A minha mãe conversava com outras, que naquele dia partilhavam a emoção dos seus filhos… Olhei o céu, pareceu ver uma nuvem sorrir com uma gota de chuva, entrei, atravessando o conjunto de lápis até as portas vermelhas. Era estudante pela primeira vez na minha vida: tinha uma profissão.
Que quadro tão grande, diferente daquele que ocupava a marquise da minha avó. O preto era tão grande que me perdia. Apressei-me a sentar mesmo desconhecendo quem se sentara a meu lado. Uma senhora alta, para mim naquela altura, com um tom de voz muito próprio, nem agudo nem muito grave, soou certas palavras que ainda ecoam na minha mente infantil, “sou a Dona Ana” Ana? Que nome vulgar… não é? Foi ela a minha tutora durante dois anos da minha vida… amiga e companheira! O primeiro dia… O que fazer? Talvez um desenho? E assim foi, com ordem pronta a professora entregou uma folha de papel e pediu que fizesse-mos um desenho. Olho em volta, todos estão agitados, que irei desenhar? Pego nos meus lápis de cor como os que vi no portão… Olho a cores lembrando as que vira horas anteriores. Começo com o azul, pinto umas nuvens… engraçado porque me lembro que pintara as nuvens de azul… Porquê? Apenas, o céu é azul e não as nuvens. Olho o papel e continua branco quase na sua totalidade, apenas um pequeno esboço de nuvens, preenche o cima da folha. Se o céu é azul, a terra é verde… desenho o lado oposto das nuvens com um verde forte, pego desta vez nas canetas de feltro, farto do traço forçado do lápis. Pinto sem me cansar um relvado. Tremo a cada traço, pinto sem arte sem perfeição. Serei artista? Serei pintor? Serei criança? E sem demoras as canetas espalham-se pela mesa, desenho uma casa, uma pessoa, outras. Desenho-as com grandes cabeças, quase que maiores que o próprio telhado da casa branca com traços de preto. Sem nariz e sem orelhas, apenas dois grandes olhos e uma boca coloriam a face dos habitantes daquela folha. Quem seriam? Seria eu, algum deles? Não sei responder…
A desenho ficara completo… ou melhor, apenas ficara completo quando olhara para o desenho do meu colega ao meu lado e vira grandes traços no céu, o que seria? Perguntei… Eram andorinhas disse-me ele. Andorinhas? Olhando o desenho, o traço preto apenas representava um grande “n” no branco do papel, fiquei espantado! Mas ao olhar o desenho dele apenas fez-me lembrar que tinha completar o meu desenho, não por causa das andorinhas, mas sim a presença do sol. Eu esquecera-me de o desenhar no meu papel. Pego na caneta amarela e faço uma bola equivalente as cabeças dos meus habitantes pitorescos, pinto-a e traço uns raios em torno, fiz um sol. Sol que tão longe estava de mim naquele momento e eu com uma caneta conseguira representa-lo… Sentia-me bem, contente com a tarefa concluída, levanto o braço contente por ter finalmente acabado.

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